Tuesday, September 16, 2014

Família e democracia

Imagine uma casa de família com um pai, uma mãe e 5 filhos. O pai (podia ser a mãe ou os dois) sai todos os dias pra trabalhar e manter esse sistema funcionando, mas ele não tem controle sobre o dinheiro que ganha, o destino desses recursos é decidido em votação por todos os moradores da casa. Isso, num microcosmo, é como a democracia é configurada hoje. Quem paga e produz tem a mesma voz eleitoral de quem recebe e consome. Então se os filhos querem uma piscina (ou uma viagem à Disney, um carregamento de Häagen-Dazs, uma doação não-contabilizada ao PSOL ou o que quer que seja), eles se juntam e votam democraticamente a favor da construção da piscina com o dinheiro do pai (quem não gosta de piscina?). 

Lógico que quem se beneficia dessa injustiça tece loas emocionadas a ela, mas nenhuma propaganda, malabarismo lingüístico ou chantagem emocional é capaz de torná-la justa. Então lá vão os consumidores de impostos e seus dependentes às urnas decidir o que fazer com o dinheiro dos outros. Suas prioridades, na ordem:


- Continuar recebendo mais dinheiro público (quando os impostos não bastarem, a dívida pra geração futura e a inflação pra geração presente também servem).

- A manutenção e, se possível, ampliação dos atuais privilégios (estabilidade no emprego de consumidor de impostos, por exemplo).

- Se, depois de ter os próprios interesses atendidos, ainda der pra ser generoso e aliviar a consciência com o dinheiro alheio, ótimo (os pobres, oprimidos e etc). 

Esse sistema de pilhagem institucionalizada vai se arrastando até a sua inevitável falência (debitada - naturalmente - na conta do capitalismo, dos EUA, do neoliberalismo ou do bode expiatório mais conveniente no momento), a Venezuela é o caso atual mais óbvio. Uma idéia (não deve ser original): 

Quem recebe dinheiro do governo não tem direito a voto, da mesma maneira que os filhos não têm direito de decidir o que fazer com o dinheiro dos pais (artistas Lei Rouanet, funcionários públicos, de estatais, O"N"Gs, empresários amigos do BNDES, sindicalistas, Bolsa-Família, empreiteiros, políticos, banqueiros, terceirizados, subsidiados pelo governo em geral e respectivos dependentes).

Não sobraria muita gente, mas talvez a democracia aí tivesse alguma chance de funcionar no longo prazo.

Thursday, February 06, 2014

O espaço entre Rand e Olavo

Conversando anos atrás com um camarada, ele disse que eu - como ateu - preenchia a minha necessidade de transcendência com a música. Uma boa observação que me fez pensar nas diferentes razões que levam uma pessoa a gostar desse ou daquele estilo musical. Faz sentido, muitas das bandas que eu mais ouvia naquela época (Low e Sigur Rós, por exemplo) faziam shows em igrejas, não só pela acústica mas também pela aura (sente a vibe transcendental) desses lugares. A maioria das pessoas não passa a gostar dessa ou daquela música de maneira tão consciente - AWARE do processo - a resposta emocional é praticamente automática ("amo isso!", "odeio isso!", "sou indiferente a isso", "meus amigos gostam disso, então imagino que eu tenha que gostar também"), mas a formação do que norteia essas reações (o que Ayn Rand chamou de "sense of life") tem várias origens e pode ser - ainda que de maneira incompleta - explicada e generalizada. Rand: "A sense of life is a pre-conceptual equivalent of metaphysics, an emotional, subconsciously integrated appraisal of man and of existence. It sets the nature of a man’s emotional responses and the essence of his character. Long before he is old enough to grasp such a concept as metaphysics, man makes choices, forms value-judgments, experiences emotions and acquires a certain implicit view of life. Every choice and value-judgment implies some estimate of himself and of the world around him—most particularly, of his capacity to deal with the world."

Claro que duas pessoas fanáticas pelo Iron Maiden, por exemplo, não têm exatamente a mesma personalidade, mas certamente possuem algo em comum lá no fundo das suas almas (mais transcendência). Olavo de Carvalho diz que "partir do momento em que o universo cultural passou a girar em torno da tecnologia e das ciências naturais, com a exclusão concomitante de outras perspectivas possíveis, era inevitável que o imaginário das multidões fosse se limitando, cada vez mais, aos elementos que pudessem ser expressos em termos da ação tecnológica e dos conhecimentos científicos disponíveis. Gradativamente, tudo o que escape desses dois parâmetros vai perdendo força simbolizante e acaba sendo reduzido à condição de "produto cultural" ou "crença", sem mais nenhum poder de preensão sobre a realidade. O empobrecimento do imaginário é ainda agravado pela crescente devoção pública ao poder da ciência e da tecnologia, depositárias de todas as esperanças e detentoras, por isso mesmo, de toda autoridade. Isso não quer dizer que as dimensões supramateriais desapareçam de todo, mas elas só se tornam acessíveis ao imaginário popular quando traduzidas em termos de simbologia tecnológica e científica." Ele completa com uma observação que alguém com um projeto musical chamado Enseada Espacial (http://www.saxpax.com/enseada-espacial-entrevista/considerou de interesse bastante pessoal: "Daí a moda da ficção científica, dos extraterrestres e dos deuses astronautas. Mas é claro que essa tradução não é uma verdadeira abertura para as dimensões espirituais, e sim apenas a sua redução caricatural à linguagem do imediato e do banal.

Ayn Rand e Olavo de Carvalho oferecem então duas interpretações inevitavelmente diferentes da realidade, entre a vida terrena e a eterna. Me identifico mais com Rand, mas a filosofia do Olavo também me atraiu por causa de algo bem enfatizado por ambos: a primazia da consciência individual. Pra quem duvida que um crente dê realmente importância à consciência individual (e, conseqüentemente, ao livre-arbítrio longe das onipotências ou onisciências determinísticas), tem a declaração que abre o seu site: "Somente a consciência individual do agente dá testemunho dos atos sem testemunha, e não há ato mais desprovido de testemunha externa do que o ato de conhecer." É ali, no silêncio sonoro das discussões introspectivas, do debate de você com você mesmo, que se forma a personalidade, que se cultiva os princípios (ou a falta deles) que vão orientar as suas escolhas éticas e estéticas. "Uma vida não examinada não merece ser vivida", Sócrates dizia - até o establishment da época ficar meio desconfortável com tamanha honestidade intelectual e decidir que ele examinava a vida até demais, ministrando então um veneninho básico pro filósofo parar de se meter a besta.

Thursday, June 13, 2013

O "passe livre"

Atendendo a pedidos (1), vou escrever algo sobre a última insensatez coletiva, o "passe livre" (o objetivo é aumentar ainda mais a minha popularidade entre os simpatizantes do "socialismo e liberdade"). A primeira coisa que notei foi a tentativa da imprensa companheira em caracterizar o movimento como apartidário, não-ideológico - "pragmático", como um professor da USP (onde mais?) o classificou hoje n'O Globo. Bastaria uma olhada de relance na galera revolucionária pra perceber as mesmas bandeirinhas de sempre do PSOL, PCO, PSTU, UNE, CUT, PCB, PC do B, MST e constatar que a agitação é apenas mais um capítulo da luta anticapitalista, não se trata dos 20 centavos (10 pros estudantes). Como destruir ônibus e estações de metrô em prol do transporte "público, gratuito e de qualidade" não é bem visto pela maioria da população, aparece então a tropa de choque da mídia amiga pra salvar a sua querida ideologia e jogar a destruição no colo do "pragmatismo". Só o fato do movimento carregar estandartes socialistas já seria o suficiente pra desqualificá-lo como "pragmático", mas este é o Brasil e ser anticomunista por aqui é muito outdemodé, estamos acima disso, além, nada deve parecer impossível de mudar. Com os estudantes radicalizados como massa de manobra, o partido há 11 anos no poder (http://youtu.be/qcE_u1oXy0s) fica livre então pra desempenhar o papel de moderado, empurrando o pêndulo ideológico ainda mais pra esquerda: "Viu só, os manifestantes querem 100% de controle estatal e o PT só quer dominar uns 70%, são mesmo muito razoáveis e democratas." Na imagem, uma menina - certamente de classe média e cheia de boas intenções - diz que eles estão "mudando o país", mas como mudar por si só não quer dizer muita coisa, o que se pode prever pela experiência histórica é uma mudança pra pior: "Estou de mudança, saí de uma cobertura com piscina na beira da praia e vou morar debaixo da ponte. VIVA A MUDANÇA!". A realidade não parece servir como parâmetro e o sonho de jovens românticos e mal informados se transforma no pesadelo de quem sabe que não existe almoço grátis.  

Wednesday, June 05, 2013

Desigualdade e diversidade 2

Então desigualdade e diversidade são conceitos semelhantes usados de maneira diferente pela narrativa oficial: desigualdade cultural = bom, diversidade material = mau; desigualdade material = mau, diversidade cultural = bom. É um problema, porque cultura e acesso aos bens materiais não são domínios diferentes, diversos ou desiguais e estão interligados. Um herdeiro, por exemplo, de um europeu carrega valores diferentes, diversos e desiguais em relação a um herdeiro de uma tribo indígena. Um tem séculos de discussão moral, literária, científica e tecnológica que o levaram a um certo tipo de civilização enquanto o outro descende de uma cultura ágrafa que usa instrumentos do neolítico e dança pela chuva; até que - um belo dia - esses dois mundos se encontram. Há um choque e as diferenças diversas e desiguais causam conflitos violentos. Pra completar, os europeus ainda trazem escravos vindos de uma outra cultura diferente, diversa e desigual - eis o Brasil. (Nota no fim de 2015: esqueci de falar da imigração japonesa e européia do século XIX) Esses desníveis culturais e, conseqüentemente, de poder atravessaram alguns séculos aos trancos e barrancos até chegar-se ao imperativo político de hoje: igualdade material com diversidade cultural. Pra resolver esse impasse entre equalização material e diferenciação cultural, o monopólio da força é convocado (como se não tivesse culpa no cartório) pra exercer o seu direito cósmico-divino de tirar de uns pra dar pra outros - tomando pra si uma boa parte como comissão - enquanto tenta promover (através de leis, subsídios e proteções) as culturas diferentes, diversas e desiguais. Como a cultura não é algo monolítico (nem a do neolítico era), esse arranjo coercitivo e artificial acaba se transformando numa guerra de todos contra todos pelo controle da máquina estatal que vai tentar então impor essa agenda paradoxal, em que bases diferentes, diversas e desiguais perseguirão resultados iguais, semelhantes e equivalentes. 

Monday, June 03, 2013

Desigualdade e diversidade

Outro dia li um panfleto de um poeta carioca em que ele começava dizendo-se um "anarquista convicto" pra logo depois clamar pela restauração do poder do estado, que deveria então controlar isso, aquilo e mais aquilo outro pra promover essa ou aquela agenda. Ele provavelmente não viu nenhum problema nessa contradição, liricamente treinado que deve ser na arte dialética. Queria o governo usando o monopólio da força pra impor aquilo que ele considera importante, mas não queria perder a aura libertária, abraçando então impossibilidades tipo "socialismo e liberdade". Essa falta de rigor lógico não veio do nada, a revolta contra a lei da identidade (A = A) não começou ontem e nem vai terminar amanhã, ainda mais quando é subvencionada pela educação oficial (que não é boba e quer mais "anarquistas convictos" pedindo mais intervenção governamental). Um dos pretextos mais usados atualmente pra uma maior concentração de poder no estado é a promoção da igualdade - (material, sexual, racial, etc e tal) - com a desigualdade desempenhando nessa narrativa o papel de grande vilã pelo que acontece de errado no mundo. "Queimou uma dentista porque ela só tinha 30 reais na conta? Fruto da desigualdade social. Matou alguém por causa de um celular? Desigualdade. Vamos então equalizar todos na marra pra finalmente sermos felizes e solidários". O curioso é que, ao mesmo tempo em que querem acabar à força com a desigualdade, tecem loas emocionadas à diversidade, como se diversidade e desigualdade não fossem praticamente sinônimos. Já o indiquei aqui antes, mas esse livro dá boas pistas pra quem quiser entender que - por trás dessa cacofonia paradoxal de conceitos, intenções e práticas - existe um método: (http://www.stephenhicks.org/wp-content/uploads/2009/10/hicks-ep-full.pdf). 

Wednesday, May 15, 2013

Ainda a Virada Cultural

O Alex (Guarani-Kaiowá) Antunes descobriu o meu texto sobre o Napalm e a Virada Cultural e resolveu compartilhá-lo duas vezes na sua página do Facebook. Eu entendo, cada um é o assunto favorito de si mesmo. À minha pergunta "alguma dúvida de que ele (AA) vai privilegiar (na escalação do tal festival com dinheiro público) aqueles de acordo com a sua agenda 'contra o pensamento branco'?", ele respondeu: "nenhuma". Gostei da sinceridade, mostrou que o racismo contra o branco (o "branco" possível num país miscigenado como o Brasil) já está tão disseminado que intelectuais orgânicos como o Alex Antunes nem disfarçam mais as suas intenções. E quais seriam elas? Reparar injustiças históricas (como se elas acontecessem no vácuo, sem um contexto) usando o monopólio das leis e das armas (o governo) pra beneficiar uns (os herdeiros dos oprimidos) às custas dos outros (os herdeiros dos opressores). Ou seja, institucionaliza-se o racismo intergeracional como política pública. "Mas é pra acabar com o preconceito e a discriminação..." Não se acaba com o preconceito e a discriminação a não ser que se acabe também com a liberdade de escolha e pensamento; aliás, nem assim, mais capaz de se aumentar o ressentimento entre as, vá lá, "raças". Será que não passa pelo radar desses justiceiros sociais que - ao se recusar uma igualdade perante a lei que incentivaria o melhor de cada indivíduo único, pessoal e intransferível - está se estimulando um conflito que, aí sim, não vai ter fim? Agora são os "negros" e "índios" a reclamar do passado, no futuro serão os "brancos" a reclamar do presente. Quando isso vai parar e as pessoas vão poder se relacionar como seres humanos responsáveis pelas próprias vidas? Aparentemente nunca, se você acreditar - como esse pessoal acredita - em alguma espécie de determinismo social, racial, sexual ou histórico. No segundo compartilhamento do meu texto, o Alex (Guarani-Kaiowá) Antunes disse que "finalmente alguém enxergou a continuidade entre o underground de sp nos anos 80 e o momento político-cultural atual :D". Nem foi tão difícil assim, a esquerda universitária brasileira reverbera - com alguns anos de atraso e um tempero, digamos, antropofágico - o bumbo tocado pela esquerda universitária americana com as suas cotas e feminismos contra o homem branco heterossexual e ocidental, o Judas do PC contemporâneo. 

Wednesday, May 08, 2013

J.F. dos Santos, Luana Piovani, Tyra Banks e Dr. Oz

Já se entende, a essa altura do campeonato, que a guerra cultural travada pela esquerda não se resume à velha luta de classes - burgueses X proletários - e engloba todo e qualquer potencial conflito capaz de gerar um controle maior sobre os grupos considerados opressores e exploradores. Um dos fronts usados nessa campanha é um tipo de feminismo em que a igualdade perante a lei não é o suficiente e enxerga a mulher como um ser oprimido e explorado pelo patriarcado. O homem (heterossexual e, de preferência, branco) é o vilão e a história nessa narrativa parece movida por grupos estanques com comportamentos uniformes ao invés de indivíduos com as suas próprias escolhas e circunstâncias. Uma das formas de expressão desse feminismo é o politicamente correto, um filtro ideológico em que certas verdades inconvenientes são substituídas por platitudes, eufemismos e inversões mais confortáveis pra sensibilidade contemporânea. Dois casos nos últimos dias me chamaram a atenção. 1: um texto do Joaquim Ferreira dos Santos em que ele - responsável pela coluna reduto do politicamente correto carioca - vinha com aquele papo cheio de lirismo de que as mulheres não deviam se preocupar com as suas celulites, que os homens não reparam nisso e tatatá. Esse texto foi fartamente compartilhado - onde já se viu, um homem preferir uma mulher magra a uma gorda, isso é opressão, mulher que se exercita pra ficar com menos celulite está se submetendo ao patriarcado, ao padrão de beleza imposto pelo capital etc e tal. A Luana Piovani - apresentadora do Superbonita que não é exatamente famosa por reprimir os pensamentos - respondeu o seguinte ao texto do JFS: Sugestão declinada. Teremos sim programa para como se livrar delas. Precisamos de audiência e ninguém vai assistir a um pgm que incentive a inércia no duvidoso. Incentivamos a sua melhor versão. Todos temos!" Legal ler mais alguém do mainstream artístico questionando esse enaltecimento do menor denominador comum do pensamento PC. Ué, existe mesmo um certo padrão de beleza (que é menos imposto e mais natural do que esse feminismo imagina) e quem se interessa e se esforça - seja do grupo que for - pode aproximar-se dele ou mesmo alcançá-lo, por que não?, isso vale pra homens e mulheres. 2: mudando de canal, parei no programa do doutor Oz, um médico que ia sempre no programa da Oprah "You Go, Girl!" Winfrey. O doutor mostrava a história de um casal em que a mulher ganhou 30 quilos logo após o casamento. O marido tava insatisfeito (a esposa também, chegou a chorar) e eu imaginei que o objetivo da reportagem fosse encontrar uma maneira de fazê-la emagrecer. Aí volta pro estúdio com o casal, o doutor Oz e a Tyra Banks conversando e descubro que eu havia me enganado, o objetivo não era o emagrecimento da mulher, o objetivo era fazer com que o homem se envergonhasse de querer que a sua mulher perdesse peso. "Você quer que ela perca peso pro seu próprio prazer ou pra saúde dela?", o Oz perguntou, no que ele respondeu "não, doutor, só estou pensando na saúde dela", e a Banks então ameaçou: "você se dispõe a passar pelo detector de mentiras?".

Tuesday, May 07, 2013

Napalm e a Virada Cultural

Não sei se notaram, mas existe, por trás de toda a discussão cultural brasileira, um embate ideológico - ou sendo menos pejorativo, filosófico - que acaba se sobrepondo às declaradas diferenças subjetivas (ou nem tão subjetivas assim) sobre beleza, estética, técnica, prazer ou diversão. Outro dia mesmo, eu tava assistindo a um documentário sobre o Napalm, casa de shows underground de São Paulo do início dos anos 80, em que isso ficou muito claro. Os punks dominavam o lugar por causa da sua revolta agressiva e sem muito foco - contra o "sistema" - no que eram insuflados pelos estudantes mais politizados da USP que, dava pra perceber pelos depoimentos, tinham claramente uma visão marxista da história. Um desses, Alex Antunes, disse que as bandas cariocas da época não eram bem-vindas por lá porque eram "comerciais" e "faziam o jogo das gravadoras". Essa rejeição ou cooptação baseada em afinidades ideológicas - ou sendo menos pejorativo, filosóficas - vem (pra pegar um gancho do livro novo do Lobão) desde antes da Semana de 22 e é determinante pro sucesso ou fracasso de um artista (pelo menos entre essa intelligentsia). Se o artista foge do cânone aprovado pela academia (no caso brasileiro = estatista, nacionalista, coletivista, anti-americanista e anti-cristianista), ele é rejeitado; se o abraça, é cooptado. Enquanto o esquerdismo cultural ficava somente na academia e longe do poder, essa agenda se restringia às críticas e teses abraçadas pelos jornalistas companheiros, mas essa hegemonia nas universidades (o lugar onde teoricamente se concentrariam as pessoas inteligentes) e o conseqüente domínio do discurso público acabariam por ter força o suficiente no imaginário coletivo pra que os seus representantes políticos (PT) finalmente chegassem completa e inapelavelmente ao poder. Então agora o Alex (Guarani-Kaiowá) Antunes não precisa mais pedir pra entrar de graça em boates alternativas e trabalha pra prefeitura petista de São Paulo decidindo quais artistas merecem receber o dinheiro dos "contribuintes" paulistanos na tal Virada Cultural. Alguma dúvida de que ele vai privilegiar aqueles de acordo com a sua agenda "contra o pensamento branco"? (http://viradacultural.org/alex-antunes-nao-ouvi-e-nao-gostei-nao-e-uma-atitude-rock/)

Friday, May 03, 2013

Lobão e a altinha nas praias do Rio

A última entrevista do Lobão e a sua inconsistente mas inegável guinada liberal (assinou inclusive a filiação ao projeto de partido Libertários) atraiu toda a reação esperada dos governistas do PT e simpatizantes tentando desqualificá-lo. Algumas reclamações eram sobre a forma um tanto dura com que ele tratou alguns medalhões da MPB, esquecendo-se do conteúdo: a crítica aos fartos subsídios estatais que esses artistas famosos recebem. Crítica justa, quem não é beneficiado diretamente é obrigado a arcar com essa *generosidade* do governo brasileiro. Isso não é simplesmente "incentivo à cultura", existe uma simbiose entre quem recebe os subsídios e quem os concede - em português claro: o estado compra (ou aluga) consciências. Ou algum edital se propondo a criticar o governo, seus aliados e suas políticas tem alguma chance de ser - na linguagem dos burocratas - CONTEMPLADO? As pessoas se reunirem com quem elas se identificam é uma coisa, panelinhas bancadas às custas dos outros é outra. Se não se consegue diferenciar uma associação voluntária (mercado) de uma exercida através da imposição (estado), fica difícil a discussão. Então o Lobão foi acusado de diversas coisas, mas uma acusação específica é um verdadeiro clássico da mentalidade submissa ao poder: a de que ele seria "contra o Brasil". Não, ele não me parece ser "contra o Brasil", me parece ser contra o que o Brasil se tornou, porque país e governo não são sinônimos - ou então toda oposição seria anti-patriótica e se esse raciocínio não for tirânico, não sei mais o que é. Eu mesmo acabei de passar umas semanas na Europa e a volta foi meio traumática, porque alguns contrastes ficaram muito claros. As pessoas no Brasil - em geral - são barulhentas e não têm muita noção do espaço alheio. Isso se reflete não só no excesso de intromissão estatal (essa confusão infernal entre público e privado), mas nas coisas mais comezinhas do dia-a-dia. Por exemplo, meio cansados do frio europeu, chegamos e fomos direto à praia. Como a praia é pública, ela é teoricamente de todos, o que corresponde a dizer que ela não é de ninguém ou é de quem se impõe mais joselitisticamente. Nos sentamos perto da beira do mar e do nada surgiram várias rodas de altinha em nossa volta. Dois caras simplesmente se afastaram 20 metros um do outro e brincaram de cruzar a bola sobre alguns - na linguagem do RJTV - BANHISTAS pra testar as suas miras. Mesmo que tivessem a precisão de um canhotinha de ouro circa 1970 (não tinham), a mera possibilidade de receber uma bolada em alta velocidade na cara já era o suficiente pra deixar as pessoas próximas meio tensas e arruinar aquela vibe contemplativa praiana. Seria então anti-patriótico da minha parte sugerir que talvez esse modelo de praia *pública, gratuita e de qualidade* não é lá o melhor possível? Que as leis que regulam a ocupação daquele espaço não são cumpridas e dão margem pra corrupção dos agentes públicos? Que mesmo quem não vai à praia já paga pela sua manutenção com impostos e que uma privatização poderia dar os incentivos necessários pro uso daquele lugar ser mais justo, eficiente e econômico? "Nesse trecho pode ter altinha, naquele outro pode ter cachorro, ali pode-se fumar, aqui não e etc?" Existem várias praias particulares pelo mundo, mas já posso ouvir os protestos de quem imagina essa proposta como uma abominável forma de segregação social, como se os mais pobres precisassem de uma estatal de telefonia pra adquirir celulares ou de uma estatal de comida pra comer. Eu e (imagino que) o Lobão não somos "contra o Brasil", apenas desconfiamos que as coisas podem (e devem) melhorar e que a concentração de poder no governo não é o modo mais indicado de alcançar isso. 

Thursday, May 02, 2013

O "grande salto pra frente" do PT

Semanas atrás, rolou uma série de mensagens do Olavo de Carvalho no Facebook metendo o pau nos libertários, e apesar de não recordar exatamente o que ia nos textos, lembro de ter dado boas risadas. O que ficou na minha cabeça não foram nem as críticas do Olavo aos libertários (deve ter sido algo na linha "vocês são uns iludidos que abraçam toda a agenda cultural esquerdista"), mas o desprezo sarcástico com que certos libertários trataram alguns dos seus alertas que considero pertinentes. Por exemplo, as denúncias sobre o Foro de São Paulo. Não é claramente óbvio e obviamente claro que os países membros do Foro realmente se apóiam mutuamente no matter what? Que qualquer coisa que aconteça na região e não vá contra o tal socialismo do século XXI conta com o suporte amigo e mesmo financeiro do governo brasileiro? Ué, existe um esforço concentrado e combinado entre as esquerdas latino-americanas e isso não é paranóia ou teoria da conspiração, é só ligar lé com cré. Como o "mundo melhor" dos socialistas do PT e simpatizantes não se materializa por aqui de um dia pro outro com a tomada do Palácio de Inverno pelos bolches numa revolução abrupta e violenta, mas gradualmente e através do processo democrático (50% + 1 virou critério de justiça), poucos se dão conta do que está acontecendo. Pra quem ainda não entendeu, a última peça de propaganda petista tirou a dúvida: o "progresso" (aspas hiperativas e imperativas) do Brasil num grande salto pra frente (alô, Mao) com uma bandeira vermelha sinalizando o futuro da nação (http://youtu.be/qcE_u1oXy0s).

Monday, April 29, 2013

Portugal "contra o empobrecimento"

Um dos prazeres que tenho ao viajar é assistir aos programas locais de televisão - e quanto mais RJTV ele for, melhor. Em Portugal, não pude deixar de notar que dois assuntos dominavam completamente o noticiário: futebol e as peripécias do governo. Falavam tanto do governo que as reportagens das RTPs e SICs me fizeram acreditar que o cidadão português é ainda mais estatizado que o brasileiro, se é que isso é possível (claro que é). O tema principal era o plano de *austeridade* do atual governo social-democrata que previa alguns cortes de gastos pro país continuar com algum crédito na praça européia. O impressionante é que, entre as várias pessoas ouvidas pelos telejornais, nenhuma ponderava que "realmente, tem alguma coisa errada quando o governo sistematicamente gasta mais do que arrecada e um corte em certas áreas pode ser uma política razoável." Não, todos eram contra, não pode, de jeito nenhum, onde já se viu, e as autoridades mais entrevistadas (e aparentemente respeitadas) eram os políticos do Partido Socialista e do Partido Comunista Português (!!!). Nem um neoliberalzinho malvado, insensível e de meia tigela pra dar o ar da graça, ô pá! Na praça principal de Lisboa, um cartaz anunciava a "marcha contra o empobrecimento" convocada pelas CUTs locais e com ampla divulgação da imprensa - como ser a favor do empobrecimento? Por que nunca convocam uma "marcha pela compreensão das causas do empobrecimento"? É longa a marcha até um entendimento mais universal das coisas, apelos emocionais em prol de grupos de interesse específicos parecem surtir mais efeito. O "empobrecimento" de que os sindicatos estatais portugueses falavam tinha relação com um eventual corte nos gastos públicos, eles estavam - na realidade - falando do "empobrecimento" deles mesmos, mas isso não era explicado no cartaz. Pra reforçar a confusão, uma manchete de jornal no caminho pra Sintra me chamou a atenção: "Funcionários públicos vão pagar mais impostos". Qual a manipulação em questão? Funcionários públicos - e aí se incluem os políticos - não são pagadores de impostos, são recebedores de impostos (questão de fato, não de opinião) e o mais correto e honesto seria estampar: "Funcionários públicos vão receber menos impostos".  

Thursday, March 28, 2013

Feliciano

Então foi decidido nas últimas semanas que o grande assunto é uma comissão de direitos humanos e minorias que nem deveria existir e o evangélico aliado do PT eleito pra presidi-la. De um lado, os religiosos que seguem a bíblia e consideram pecado o homossexualismo. De outro, as almas sensíveis que não conseguem viver com a idéia de que nem todo mundo aprova o estilo de vida de todo mundo. Impasse - e como normalmente acontece nessas situações, o monopólio armado da sociedade é convocado ou se convoca pra beneficiar um lado às custas de todos os outros. Não basta a agressão contra quem quer que seja ser ilegal, são necessárias leis especiais e específicas especialmente e especificamente feitas pra certos grupos especiais e específicos. Essa noção não veio do nada, o debate no Brasil segue com anos de atraso o que vem sendo discutido nos centros de insensatez ilustrada e institucionalizada - conhecidos como universidades - lá de fora (principalmente do grande satã, os EUA). Veio daí o politicamente correto, que busca fazer as demandas dos grupos considerados historicamente "oprimidos" prevalentes sobre os grupos considerados "opressores" - basicamente todos contra o homem branco heterossexual capitalista e, em geral, cristão. É uma tática de conquista e concentração de poder tão antiga quanto andar pra frente - dividir pra conquistar - e vem funcionando que é uma beleza (pelo menos pra quem instiga e se beneficia dessas divisões). O tal pastor é claramente um crente tosco feito sob medida pra indignação coletiva e seletiva da esquerda PC-PSOL, mas repare também nas opiniões dessas mesmas pessoas que fazem esse escarcéu todo. Se o pastor acredita em "povo amaldiçoado", seus perseguidores acreditam em "socialismo e liberdade", como proceder? Me parecem duas faces da mesma moeda de um irracionalismo militante, triunfos da sensibilidade subjetiva sobre a realidade objetiva, da vontade sobre a verdade.  

Tuesday, March 26, 2013

Marighella e a "nova" utopia

Parei de ler jornal. Quer dizer, estou parando, não se pára simplesmente de ler jornal, todo dia é um desafio ("não dê a primeira olhada"), ainda mais quando o jornal fica aparecendo na sua porta mesmo quando você não o assina mais. Num desses momentos de fraqueza, me deparei com uma coluna do Caetano Veloso em que o grande ídolo da MPB escrevia que o Marighella representava a "sede de justiça", entre outras coisas laudatórias e maravilhosas. Senti quase uma ressaca pela equiparação *comunismo = justiça* e por muito pouco não cometi um texto, mas me segurei, cansei de ler jornal e de dar murro em ponta de faca. Dias depois, fiquei sabendo que o Caetano tinha feito também uma música-homenagem ao comunista baiano, o Che Guevara brasileiro, que ótimo. Eis que hoje não resisto mais uma vez à tentação e abro o Segundo Caderno pra ver como anda a guerra cultural gramsciana brasiliana e encontro o DJ Saddam com uma tatuagem de quem? Do Marighella - "o guerrilheiro que teve a sua utopia cantada por Caetano e aplaudida por jovens no Circo Voador" - dizendo que a "juventude vê Marighella como um símbolo dos ideais L I B E R T Á R I O S que a moveu no passado". Socialismo não tem nada a ver com liberdade, socialismo é e sempre foi I M P O S I Ç Ã O estatal, C O N T R O L E governamental - o contrário de um ideal libertário. A coluna Gente Boa então perguntou pro Saddam (filiado ao PC do B, que surpresa) "qual é a nova utopia?" e ele respondeu: "o velho respeito ao próximo", uma coisa muito linda e humana mesmo, que monstro insensível seria capaz de se opor ao "respeito ao próximo"? Não sei exatamente qual era o "respeito" que os heróis políticos do Marighella e do Saddam tinham pelos seus próximos quando chegaram ao poder, o problema maior era como eles tratavam os não tão próximos assim, aqueles que não concordavam com eles; havia algum "respeito ao próximo" nos gulags e no paredón? "Ah, que apelação, falar em paredão!" Dizer que o que o ser humano aprende com a história é que ele não aprende com a história não é o suficiente, a insensatez atingiu um nível que só mesmo um mergulho completo e absoluto nessa "nova" utopia (pra sentir na pele o que ela faz) é capaz de reverter. Com o PT há 10 anos no poder, uma classe artística dependente e submissa ao estado e uma imprensa companheira, esse momento parece estar chegando ou até mesmo já ter chegado - e poucos, poucos demais pra fazerem alguma diferença, parecem ter se dado conta. 

Thursday, March 21, 2013

Igreja e a fruição do desejo

O pessoal da esquerda consciente ou inconsciente fica revoltado com a igreja porque ela reprime, é retrógrada e não deixa correr solta a fruição do desejo da galera. "Por que existe a culpa?" Porque as pessoas - querendo ou não - têm uma consciência ou inconsciência que está a todo momento pesando os prós e os contras das suas atitudes e decisões. Sente culpa porque pode ter prejudicado alguém e isso pode se voltar contra você. Se você age mal com alguém e sabe que agiu mal, aquilo fica martelando a sua cabeça porque a lógica e o seu instinto de sobrevivência sabem que não é bom sair por aí prejudicando as pessoas, que esse comportamento pode ter volta, que amanhã o prejudicado pode ser você. Então a religião existe há milhares de anos e parece não arredar pé, geral continua dizendo que acredita em Deus e tal. Por que uma instituição que fica tolhendo os prazeres - me dizendo que eu não posso fornicar ou usar drogas e que se eu fizer essas coisas e não me arrepender eu vou direto pro I N F E R N O - tem tanta força? Sem entrar na questão das leis - todo mundo devia ter o direito de fazer o que quiser desde que não inicie agressão contra os demais - o cuidado com o sexo e as drogas faz sentido do ponto de vista evolutivo. A esquerda consciente ou inconsciente comemora a legalização do aborto porque isso estimula a fruição do desejo da galera sem a conseqüência de um filho indesejado, tão indesejado que a pessoa está disposta a eliminá-lo. A igreja vai lá e diz: "não, aborto é errado, aquela vida ali já começou e é sagrada." A pessoa que transou sem pensar nas possíveis conseqüências vai gostar disso? Não, não vai. Os melancias doidos pra controlar a população da "praga humana" que explora a mais-valia ambiental vão gostar disso? Não, não vão. Toda a contracultura cultural boêmia artística movida a drogas também fica contrariada - eu incluído - mas quem pode negar o potencial problema do uso de drogas? Não é à toa que tantos ex-drogados viram religiosos, o troço é perigoso e não precisa ir na cracolândia da sua cidade pra perceber isso. Então o que um ateu como eu está tentando dizer é que a religião tem alguns mandamentos morais cruciais que não funcionam se o objetivo é a fruição sem conseqüência do desejo da galera, mas que funcionam se o objetivo é a sobrevivência da espécie. "Não saia por aí transando de qualquer maneira porque você pode ter um filho indesejado E tenha cuidado com as substâncias entorpecentes porque você pode se tornar um zumbi" são recomendações que fazem sentido pra preservação da vida tenham vindo do divino ou da examinação racional da realidade. 

Tuesday, October 09, 2012

Globo e a "cidadania"

Quem, como eu, gosta de eventualmente acompanhar o cotidiano diário do dia-a-dia através do RJ TV, já percebeu que a palavra "cidadania" é uma das preferidas da Globo, não só nos noticiários como nos intervalos ("cidadania, a gente vê por aqui"). Mas o que seria a "cidadania"? Cidadania (do latim, civitas, "cidade") é o conjunto de direitos e deveres ao qual um indivíduo está sujeito em relação à sociedade em que vive. Como vivemos numa democracia, cidadão é aquele que se submete (ou melhor, é submetido) ao que é decidido pela maioria. Claro que isso dá margem a muita injustiça, até porque a maioria não é critério de justiça, mas o meu ponto principal nem é esse. O meu ponto é que grandes empresas como a Rede Globo fazem propaganda da obediência aos ditames governamentais porque elas mesmas não têm como escapar dessa imposição. Quanto mais visível a empresa, mais facilmente ela é fiscalizada pelo governo, mais ela é forçada a cumprir com os seus *deveres* (obrigação de passar tantos por cento de conteúdo nacional, por exemplo) e mais ela é incentivada a correr atrás dos seus *direitos* (crédito subsidiado do BNDES, por exemplo). Qual o resultado disso? Governo e grandes empresas em simbiose, unidos na promoção do "contrato social", da "cidadania", da submissão à democracia.

Thursday, September 13, 2012

Szasz e as drogas

Desde cedo, tive a impressão de que a guerra contra as drogas era uma insensatez, uma afronta à noção de que a pessoa é livre - desde que respeite as demais - pra fazer o que quiser com a própria vida. Acompanhava as guerras nos morros pelo controle do tráfico, a corrupção escancarada da polícia e as prisões lotadas, mas não via muita gente questionando a lei que dava margem a toda essa maluquice trágica ao criminalizar o consumo e a comercialização de certas substâncias. Tem algo de muito errado aí, e foi assim que comecei a me aprofundar na filosofia da liberdade, pra entender as bases que fazem uma sociedade realmente livre. Nesta semana, morreu um dos grandes defensores da autonomia individual frente à tutela governamental, o psiquiatra húngaro Thomas Szasz, este texto é inspirado numa palestra dele. (http://youtu.be/1LoSgdpHnUkNinguém é culpado até que se prove o contrário. Não se pode punir alguém sem que essa pessoa tenha - de fato - agredido alguém. Pessoas pacíficas que se envolvem apenas em relações voluntárias têm de ser deixadas em paz. A questão não é sobre o abuso de drogas, é sobre a responsabilidade individual. Quanto maior o controle de fora sobre uma pessoa, menor o controle que ela vai ter sobre si mesma. A aliança entre a classe médica e o governo. Nem todas as drogas são criminalizadas, algumas são *permitidas* desde que prescritas por médicos aprovados pelo governo. Então, de alguma maneira, não são apenas a maconha, a heroína e a cocaína que são ilegais, todas as drogas são ilegais. Se você precisa de permissão governamental pra tomar uma substância, essa substância não é livre. Essas exigências dão aos médicos que passam pelas triagens do governo o monopólio de decidir se a pessoa *precisa* ou não de uma droga, imposição que infantiliza o indivíduo, tratando-o como incapaz. Eu não posso decidir usar drogas por motivos religiosos, espirituais, estéticos, recreativos, psicológicos, experimentais, paranormais ou o que seja, outros decidem por mim. Se o governo tem alguma função (tenho dúvidas), é a de proteger as pessoas de perigos externos, ele não tem o direito de me proteger de mim mesmo. Existe um exército se outros países quiserem invadir e uma polícia se outras pessoas quiserem roubar ou matar. Se eu quiser me invadir ou evadir, isso não é da conta do governo. 

Tuesday, September 11, 2012

"Mania de ser diferente"

Anos atrás, conversando no telefone com uma tia muito querida, falei algo que agora não lembro e ela respondeu: "Ah, Sol, mas que mania você tem de ser diferente!" Dei risada, é claro que eu sou diferente, todo mundo é diferente, não é óbvio? Mesmo entre os homens-massa de Ortega Y Gasset, os boobus americanus de Mencken e os freqüentadores de micareta do Brasil, há uma diversidade que generalização nenhuma - por mais genial que seja - é capaz de abarcar. Alguém pode ser uma nulidade intelectual e uma sumidade esportiva, um dínamo social e um fracasso profissional, um fenômeno artístico e um desastre automobilístico, as possibilidades e circunstâncias são infinitas. Por que eu digo isso? Porque por mais que os governos do mundo (e do Brasil em particular) façam campanha e propaganda da "diversidade", o que eles promovem - na realidade - é a uniformização, a padronização e o conformismo. Se todas as pessoas são diferentes, por que existe um currículo único imposto a todos pelo MEC? Por que todas as crianças são obrigadas a freqüentar esses centros de doutrinação estatal com seus hinos e diplomas necessários pra se exercer qualquer atividade profissional? Se o objetivo fosse realmente estimular a "diversidade", não faria mais sentido se livrar de todos esses controles e promover - de fato - a liberdade?  

Tuesday, September 04, 2012

O mensalão

"Mensalão significa o ato de corrupção em que uma grande soma em dinheiro é transferida periodicamente e de forma ilícita para favorecer determinados interesses.Usando essa definição e o princípio de não-agressão, me parece claro que a atual configuração do estado democrático não passa de um grande mensalão. Os eleitores trocam votos e doações de campanha por algum benefício futuro, os deputados trocam votos no Congresso por alguma vantagem, os partidos barganham apoio ao governo em troca do controle de algum ministério ou estatal e por aí vai, a política acaba se tornando um imenso toma-lá-dá-cá. Isso não seria um problema se os agentes públicos usassem as próprias propriedades nessas trocas, mas esse não é - obviamente - o caso. O dinheiro público - por ser arrecadado de maneira não voluntária - já constitui, por si só, desvio de verba. O benefício que um eleitor (um indivíduo sem posses ou um grande empreiteiro) espera receber em troca do seu voto ou doação de campanha pro candidato X não vai sair do bolso de X, vai sair do bolso de quem não está recebendo esse benefício. A aprovação no Congresso de uma lei do interesse do Executivo não vai ser bancada pela bancada governista, vai ser paga pelo resto da população. A própria existência de dezenas de ministérios e centenas de estatais - que servem de barganha pra esse *presidencialismo de coalizão* - é um custo que aqueles que não participam diretamente do esquema são obrigados a arcar. Qual é a grande diferença então dessas relações *democráticas* pra definição de mensalão que iniciou o texto? Claro que isso não absolve o PT, um partido já há 10 anos no poder que não moveu uma palha pra mudar esse sistema. Pelo contrário, foi eleito justamente pra manter e - se possível - ampliar esses interesses estabelecidos e exercidos às custas de todos os que não se locupletam nessa corrupção oficializada e generalizada. (http://www.significados.com.br/mensalao/

Thursday, August 23, 2012

Freixo e as ideologias

As eleições se aproximam e chega o momento em que se ouve a pergunta: "Em quem você vai votar?" Em ninguém, não quero mais dar sanção a esse sistema político. "Mas e o Freixo?" Sou contra qualquer candidato socialista. "Mas ninguém liga mais pra ideologia, já ouviu as propostas dele?" Nem precisa, o cara ainda considera o socialismo uma boa idéia, já é o suficiente. "Mas o capitalismo também é uma porcaria..." Me diga então uma coisa, onde você preferiria viver, na antiga Alemanha Ocidental ou na Oriental? Na Coréia do Sul ou do Norte? "Não se trata disso..." Se trata sim, a Coréia do Norte e a Alemanha Oriental são a conseqüência do socialismo que você - em maior ou menor grau - defende. "Ninguém liga mais pra ideologia..." Dizer que "ninguém liga mais pra ideologia" é o mesmo que dizer que ninguém liga mais pra idéias, e as "propostas do Freixo" são justamente as suas idéias. Quem se imagina *pragmático* e acima das ideologias talvez nem perceba, mas o Pragmatismo também é uma ideologia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Pragmatismo). A coisa vai além disso, claro. Quando você testemunha o horário eleitoral nada gratuito e vê praticamente todos os candidatos prometendo as mesmas coisas, você percebe que existe uma certa homogeneidade ideológica, uma doutrina implícita que alguns podem confundir com o bom senso. A social-democracia dominante (essa mistura de socialismo fabiano, marxismo e nacionalismo) não é uma inevitabilidade da natureza como o movimento das marés, é uma construção ideológica com propagandistas (bem pagos ou não) que cuidam pra que certos interesses estabelecidos não sejam ameaçados por uma ideologia contrária. Por isso que qualquer idéia fora do espectro social-democrata (o liberalismo, por exemplo) é imediatamente desqualificada por esses ideólogos do status quo como coisa de gente ingênua, maluca, paranóica, babaca ou FDP mesmo. Não, o governo não tem a obrigação cósmico-divina de existir e muito menos de controlar a saúde, educação, segurança, transporte, lazer, alimentação, cultura, comércio, emprego, crédito, telecomunicação, meio ambiente, petróleo, minério de ferro, carnaval, entrega de cartas e o escambau, isso é o que as pessoas no poder (e as que querem chegar no poder como o Freixo) querem que você defenda, e não é tão difícil assim de entender o motivo. 

Wednesday, August 15, 2012

O "mundo real"

Sempre que se tenta discutir princípios que questionem o status quo, aparece alguém dizendo que "isso não funciona no mundo real". Algumas mudanças realmente não têm chance de acontecer, coisas imutáveis que fazem parte da estrutura da realidade, leis naturais que não se curvam à vontade humana. Por mais que eu tente, balançar os braços não vai me fazer voar. Por mais avançada que a medicina se torne, continuaremos morrendo. O modo como as pessoas se relacionam, no entanto, pode ser mudado, assim como o modo como o poder é exercido. Construções humanas são possíveis de mudar justamente por serem construções humanas, mas se um deputado chegar e propor - por emenda constitucional - a abolição do pôr do sol, esse parlamentar vai estar realmente ignorando o mundo real. Agora, se ele propor a descriminalização das drogas, por exemplo, ele não vai estar ignorando o mundo real, mas simplesmente indo contra a opinião de algumas pessoas, não há nada impossível nessa proposta. Pra usar um caso clássico, um abolicionista em 1700 também seria acusado de "ignorar o mundo real" ao defender algo tão distante dos costumes da época, mas o tempo passou, as percepções se alteraram e finalmente se tornou uma abominação alguém pertencer a alguém. Quer dizer, nem tanto, porque hoje em dia essa escravidão tomou outra forma e as pessoas continuam - de uma maneira certamente mais suave - sendo propriedades umas das outras, a diferença é que agora elas são obrigadas a servir ao que quer que seja determinado pela maioria através do estado e seus representantes, os políticos. Tem que ser assim? Não necessariamente, não existe nenhum contrato social assinado em pedra, esse é apenas o modo como a sociedade é atualmente organizada (ou desorganizada) e isso pode mudar, basta as pessoas - ou uma boa parte delas - chegarem a essa conclusão.