Friday, January 22, 2010
Questão de gosto: o que é e o que não é
O textinho sobre o Paulo Coelho rendeu boas discussões, mais do que rendem os posts que faço sobre princípios e conceitos abstratos, porque determinar o que é bom ou ruim na arte é mesmo um dos passatempos mais apreciados pela garotada. Não me excluo não, faço parte da garotada também. O Paulo Coelho não é uma unanimidade do contra, obviamente, se 1 milhão de pessoas não gostam do que ele faz, outras tantas gostam. Quando a coisa só afeta você e o objeto da sua adoração ou danação, pode-se dizer que é só uma "questão de gosto", quando a coisa coloca o dos outros na reta, o bicho começa a pegar. Por exemplo: você gostar da banda Carrapicho não me afeta tão diretamente que me faça perder tempo e neurônios apontando as minhas diferenças com a estética Carrapicho. Foda-se se eu acho aquelas roupas ridículas. Mas se o governo acha que, por ser uma das favoritas do povão, a banda Carrapicho merece receber subsídios, aí sim vou gastar o meu tempo e os meus neurônios criticando isso. Se você acha justo que o estado patrocine essa ou aquela estética, a coisa transcende em muito a "questão de gosto", porque essas políticas afetam a todos, gostem ou não do Carrapicho. Deu pra entender a diferença? Claro que as pessoas continuam tendo a liberdade de criticar o Paulo Coelho, a banda Carrapicho ou a Maria Gadú, que bom que a liberdade de expressão ainda existe, não é verdade? Mas não há crítica que apele ao "bom gosto" capaz de fazer o Zé das Couves deixar de bater forte o tambor ao ouvir a sua banda favorita, aquela que o faz balançar o esqueleto. Não adianta eu apresentar a ele o som da minha banda favorita de post-rock, ele não tem a mesma personalidade e o mesmo background que eu, por isso que o valor é subjetivo e depende da avaliação individual de cada um. Um abadá pode valer milhares de reais porque existem pessoas dispostas a pagar esse preço pra suar e beijar muuuito no carnaval da Bahia, enquanto o meu interesse pelo abadá é bem reduzido. Claro que se me oferecessem um abadá de graça, ele me interessaria, porque eu poderia vendê-lo e, com esse dinheiro, suprir as minhas próprias necessidades estéticas. Então o camarada pode lamentar o quanto quiser o "mau gosto" do povão, mas não tem o direito de impor ao povão o que ele acha ser o "bom gosto", da mesma maneira que o governo não tem o direito (em tese, porque a prática diz o contrário e por isso mesmo que insisto no assunto) de usar o dinheiro do povão pra patrocinar o que ele considera bacana. Imagine por um segundo que é eleito um governo com um gosto indie. Esse governo quer estimular o povão a consumir coisas indies - de "bom gosto" - e deixe de ir ao funk ou ao forró e passe a frequentar a festa Maldita na Casa da Matriz. Pra isso, ele passa a subsidiar com o dinheiro do feijão do povão essa festa e toda a cena indie carioca. Os produtores indies vão adorar essa força do poder público, vão ter mais recursos pra incrementar a cena que o governo considera muito maneira, mas isso torna a coisa justa? É justo usar o recurso dos outros pra beneficiar esse ou aquele tipo de manifestação estética? Sim, estou questionando toda a política cultural brasileira, se a mensagem ainda não ficou clara o suficiente.
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14 comments:
É, meu caro Sol, mas você sutilmente esqueceu de colocar nos 'subsídios' a um tipo ou outro de música o papel decisivo dos DONOS de TV, rádio e todas as outras mídias, EMPRESÁRIOS de shows, EXECUTIVOS de gravadoras... esses é que dão mais 'subsídios' a um tipo de música ou outro, muitas vezes com o NOSSO dinheiro, pelo abatimento nos impostos das leis de incentivo. Por que será que você não mencionou esse lado da questão?
Estou questionando aqui o gosto estético, mas que bom que você tocou nesse assunto. Sim, sou contra todos os tipos de incentivos e subsídios, quero que o estado se separe da economia, já te disse isso um milhão de vezes, Lois.
Não tente colocar a coisa como se eu estivesse defendendo especificamente os empresários ou os executivos.
Aliás, muito pelo contrário, né? Ao invés de tentarem agradar os donos do poder, eles teriam de oferecer algo que as pessoas realmente queiram.
Mas Sol, o lance é o seguinte, quando o governo resolve subsidiar a cultura, ele não está escolhendo subsidiar o que ele acha mais maneiro ou não e de fato, não estaria certo. Ele abre as portas para quem quiser correr atrás, seja maria gadu, carrapicho ou cigarretes.
Tanto que, por exemplo, o lance do caetano, que o MINC chegou a pensar em vetar por achar que caetano nao precisa de subsidios, pois a turnê dele pode gerar dinheiro sozinha. Fato. Mas não deu pra vetar justamente pq aí sim o governo estaria "escolhendo" e isso abriria precedentes pro governo direcionar a cultura.
Outro episódio que deu o que falar, foi o governo do rj abrindo editais pra patrocinar projetos sobre dom joão VI. Nisso o governo está direcionando a arte e não temos mais a arte pela arte.
Eh claro que temos que ter subsidios pra cultura. Todo mundo sabe que a arte, a princípio, não dá dinheiro.
Vc com esse seu discurso 100% libertário quer jogar os leões com as ovelhinhas no mesmo pasto e deixar a natureza decidir. Obvio que não vai sobrar ovelha pra contar história. É preciso sim uma pequena intervenção do Estado pra criar uma cerca pra proteger as ovelhas.
E veja bem, eu não sou nem um pouco comunista que acha que leão tem que virar ovelha.
Por "donos do poder" imagino que você queira dizer os políticos, denominação para mim errônea. "Donos do poder" são os que têm dinheiro para comprar os políticos.
Mas seguindo sua terminologia, quando os empresários e executivos tentam agradar os políticos?
E outra: em "oferecer algo que as pessoas realmente queiram", para quem quer ganhar dinheiro, quanto mais numerosas sejam as pessoas que 'quiserem', mais dinheiro se ganha. Logo, essas "pessoas" aí são a ditadura da maioria. É isso que você considera o modelo ideal?
E não me venha com a 'vocação aventureira' do capitalismo para descobrir e explorar novos filões de mercado, pois essa exploração necessariamente inclui padronização e adequação a metas de venda, mecanismos que asfixiam a diferença e a criação.
Exatamente Tati, a função do governo é justamente essa, proteger as pessoas.
O que patrocinar uma peça de teatro tem a ver com isso?
Quer dizer, as pessoas são muito sábias na hora de votar num cara que vai controlar as suas vidas por 4 anos, mas não são capazes de escolher em qual produto cultural elas vão gastar o seu dinheiro?
Sim Lois, veja você que agora o governo do PT vai dar subsídios pra alguns setores, "pra aquecer a economia".
Eis aí a parceria público-privada em pleno funcionamento.
Você está certo quando aponta o problema, mas qual a sugestão que você tem pra solucionar o problema?
A solução? Permitir e estimular a atividade crítica em toda a sua liberdade. O 'ipredator', por exemplo, garantindo o anonimato do IP, promete ajudar muito mais a cultura que todas as iniciativas públicas e privadas do momento.
Tanto ao governo de esquerda ou direita quanto ao capitalista o que interessa é a maioria, por razões complementares. Isso é ao mesmo tempo 'democracia', 'ditadura', comunismo' e 'liberdade de mercado'. Tudo o mesmo lixo.
Vemos isso bem naquele filme "O Brother Where Art Thou", quando o grupo de sucesso dos três caipiras surge no comício do candidato opositor, mas quem os arrebanha é o atual governador. Todos querem flertar com o popular.
É importante que os indivíduos pensantes e críticos reconheçam a minoria que são - ou a ilusão de pertencer à maioria pode custar caro, vide os intelectuais felizes quando o antigo regime do Xá caiu no Irã, sem saber que o que estava para surgir era uma teocracia mil vezes pior que o regime anterior.
A crítica, o duvidar de tudo que existe, a criação de problemas, precisa de proteção. Quanto mais a disseminarmos, maior diversidade de pensamento teremos. Mas não fiquemos na ilusão de que um dia seremos maioria.
Lois, eu não quero ser maioria e nem minoria, não é essa a minha pretensão, sou um indivíduo e vou me associar a outros indivíduos, se isso for do meu interesse, através de relações voluntárias.
Eu queria ouvir de você, com objetividade se possível, uma sugestão pro papel do estado, que é quem regula a convivência entre as pessoas e comanda esse processo de simbiose nefasto - que você identificou - com as corporações amigas do rei.
O estado? Não acho que ele comanda esse processo de simbiose corporativa. Ele é um instrumento de interesses econômicos de indivíduos. ESSES interesses é que deveriam ser contidos em função de um bem comum, praticamente um taoísmo. Mas não há como fazer isso, a não ser por uma mudança de mentalidade.
É como na escola - o papel dela é te ensinar coisas, mas o que vale mesmo é a convivência com colegas, que acontece por fora do "objetivo principal". Portanto, não vou ficar imaginando um "estado ideal", é absurdo.
Em outras palavras, a solução não passa pela INSTITUIÇÃO, mas pela SUBVERSÃO - a tal "revolução permanente" que todo mundo diz mas não faz.
"Todo mundo sabe que a arte, a princípio, não dá dinheiro."
Ora, isso é pura mentira. Posso garantir que Iveta Sangalo, Calipso e Claudia Leite tem garantido grandes lucros de sua arte.
O que essa gente tem medo é de admitir que por trás do paradoxo de “Elvin e os esquilos 2” fazer infinitamente mais sucesso que “Lula o filho do Brasil” está o reflexo do gosto popular.
Por quanto tempo teremos que subsidiar a incapacidade de certos artistas, que nem sequer conseguem atrair público.
Deus do Céu, aonde estava eu com a cabeça que deixei passar um posto bão desses, sô! Agora é tarrrde.
Abs. Fred.
Sol:
Esse post denuncia a idade. Carrapicho? Carrapicho?
Pois você não sabe que o Carrapicho foi tornado totalmente obsoleto pela ascensão da Banda Calypso, que também enterrou a fama do Mastruz com Leite e da Banda Maginífico's?
Podicrê, o lance agora é a banda Dejavu:
http://www.youtube.com/watch?v=gQU4PNbPMP0
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