Monday, December 28, 2009
Ouvindo "o outro lado"
Tava conversando com uma amiga jornalista e lá pelas tantas ela questionou a matéria X de um jornal porque "não ouvia o outro lado da história". É o que a gente escuta quando faz um curso de jornalismo: ouvir os dois lados. Só que a imparcialidade jornalística - vou repetir pela milésima vez - não passa de um mito. Qualquer pessoa minimamente treinada e atenta percebe qual o viés que a matéria X tem, qual a tese que ela defende. Eu gostaria de ler no "O Globo", por exemplo, "o outro lado" sobre o aquecimento global. Onde ele está? Não está, porque a direção do jornal decidiu que há um consenso no tema e quem o questiona não faz parte do grupo das pessoas legais e verdadeiramente preocupadas com o futuro do planeta. Então a realidade é que cada veículo tem a sua agenda e tenta convencer o leitor de que essa agenda merece o seu apoio. É assim e é bom que seja assim, qual seria a alternativa? O controle da informação pelo estado? Censura? Na na ni na não. Mas por que eu tô falando disso mesmo...? Ah sim, vou questionar mais uma vez algum "consenso", dessa vez o de que o grande problema do Brasil é a desigualdade social. Tá lá no "O Globo" de domingo o professor-doutor Rodolfo Hoffmann recitando direitinho o que a editoria de economia do jornal queria ouvir e publicar. O professor tem vários títulos em universidades como Yale, USP e Unicamp e as suas fotos na entrevista também tentam dar mais credibilidade à sua autoridade: numa ele está sério, certamente muito preocupado com as desigualdades sociais; noutra ele está rindo, porque apesar de ser um comprometido militante da "justiça social", ele também sabe se divertir e aproveitar a vida. Quem vai dar ouvidos a um chato carrancudo? Mas por que discutir e questionar o discurso contra as terríveis desigualdades? Porque o foco que dão ao problema (assumindo que a desigualdade seja um "problema") está equivocado. Porque quando alguém fala em "justiça social", essa pessoa está invariavelmente falando em socialismo. Porque toda vez que se discute o problema da desigualdade, se está reivindicando o controle da economia pelo estado e isso - no meu dicionário - equivale à escravidão. É muito out ser anti-socialista hoje no Brasil, não? Paciência. O professor-doutor começa louvando os aumentos do salário mínimo. Claro, quem poderia ser contra tal mecanismo? Mas o aumento do salário mínimo é aquilo que se vê. O que não se vê é a informalidade causada pelo custo não só do salário mínimo como de toda legislação trabalhista que coloca cerca de 50% da população economicamente ativa na informalidade. Como essas pessoas se beneficiam do salário mínimo? Não se ouve "o outro lado" nessa questão. Depois o professor-doutor louva o papel dos sindicatos. Claro, os salários aumentam por causa da pressão dos sindicatos, como frear a exploração da mais-valia sem os sindicalistas? Quem sou eu pra questionar o papel benevolente dessas grandes figuras, mas o que fazem os sindicatos? Na realidade, os sindicatos e a legislação herdada do fascismo italiano que os regulam correspondem a garantir aos seus integrantes uma reserva de mercado. É o corporativismo institucionalizado disfarçado mais uma vez com as melhores intenções. O Lula, aliás, tratou de garantir a esse grupo de interesse o imposto sindical obrigatório, tudo pro bem dos trabalhadores, por supuesto. Não são os sindicatos que melhoram os salários, é o investimento per capita e a produtividade do trabalhador. Eu também gostaria que todos ganhassem, sei lá, 20 mil reais por mês com jornadas semanais de 5 horas no ar condicionado com acesso irrestrito a sites pornô, mas não é assim que a banda toca. A situação econômica não melhora com decretos ou wishful thinking, muito menos com a mera distribuição da riqueza existente, como se ela fosse um bolo fixo. A riqueza precisa ser antes criada e isso não é dito pelo professor-doutor, que fala então do tal índice Gini, mais uma picaretagem criada pra justificar o controle do estado sobre a economia. De que adianta a desigualdade ser pequena se todos são pobres? Um "pobre" americano seria classe média no Brasil, e aí? Depois o professor-doutor dá o seu diagnóstico sobre a origem da desigualdade brasileira: a distribuição das terras e a falta de uma "revolução que abalasse os poderes conservadores". Percebe a retórica bolchevique? Mas estou aqui pra isso mesmo, dar "o outro lado" da história - que diria o seguinte: a distribuição de terras pode não ter ajudado, mas o fato do Brasil ter sido um dos últimos países a abolir a escravidão certamente aprofundou essa distância entre ricos e pobres. Os escravos recém libertos partiram então da base e isso não se reverte da noite pro dia. Mas algo que o professor-doutor nem cogitou foi uma política deliberada do governo - executada por décadas - chamada inflação. Ele não mencionou a dita cuja porque deve ser um daqueles acadêmicos da Unicamp que imaginam que exista um trade-off entre inflação e emprego e que a política monetária do Banco Central de juros altos pra conter a inflação é "muito conservadora". Pois foi a inflação permanente que abriu um abismo entre ricos e pobres no Brasil. Ora, os ricos pegavam a sua renda e aplicavam nos bancos, os pobres nem conta no banco tinham e viam a sua renda deteriorar-se diariamente. Se há um programa que ajudou a diminuir a desigualdade de renda no Brasil foi o Plano Real, que acabou com uma loucura inflacionária que - de tão presente - parecia fazer parte da paisagem como o Pão de Açúcar, o Pantanal e a Amazônia. Estou me alongando? Não tem importância. Depois o professor-doutor diz que a solução é "uma reforma da previdência". Qual reforma? Não se diz, mas imagina-se que não se trata de lidar com os rombos seguidos da previdência atual que vão estourar nas gerações futuras, porque isso é papo de "conservador e neoliberal". A taxação progressiva de renda também é uma das dicas do professor-doutor pra tratar do problema da desigualdade. Mas quem ganha mais já paga mais. Se alguém ganha 10 mil e é taxado em 10% da sua renda, paga 1000 reais. Se o camarada ganha 1000 e é taxado também em 10%, paga 100 reais. O que a taxação progressiva incentiva é a evasão fiscal, a fuga da poupança pra lugares mais receptivos ao capital. Se as pessoas com mais dinheiro fogem de um lugar, como é que esse lugar vai enriquecer? Mais uma vez, os professores-doutores imaginam que a riqueza de um país seja um bolo fixo, em que basta o estado benfeitor repartir o bolo de maneira igualitária pra "justiça social" se realizar. Isso é uma simplificação grosseira da realidade, mesmo que parta de alguém com doutorado em Yale ou onde quer que seja. Junto com todas as falácias, reside uma que estranhamente não é citada pelo professor-doutor, mas que é cantada por aí como a panacéia que vai colocar o Brasil finalmente no rol dos países desenvolvidos: a educação. Enchem a boca pra falar em "educação", mas nunca especificam qual educação. Essa aí controlada pelo MEC? Basta enfurnar uma criança numa escola (prisão) e doutriná-la por anos com um currículo imposto pelo estado pro país prosperar? Não se diz, porque não interessa aos apologistas do controle estatal falar, de maneira clara e objetiva, o que pretendem. Tudo é disfarçado com lindas palavras de ordem repetidas ad nauseum pra que não haja resistência às ânsias autoritárias dos planejadores. Não, o que o Brasil precisa é de menos estado e mais liberdade em todos os sentidos. Cuba (sim, é um exemplo sempre ilustrativo) tem milhares de professores-doutores doutrinados pelo non sense marxista que trabalham carregando as malas dos turistas, porque esse é o emprego mais cobiçado e bem pago na ilha-presídio. Educação... No Brasil mesmo está em curso uma banalização do curso superior promovido pelos demagogos de sempre. Daqui a pouco todo mundo vai ter diploma da alguma coisa, que vai ser usado pra tentar passar em algum concurso público, porque são esses os incentivos dados pelo sistema. Um diploma na mão e um emprego voando em alguma repartição. Eis aí "o outro lado" pra quem quiser ouvir.
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