Tuesday, December 20, 2011
A natureza e o princípio de não-agressão
A natureza, como se sabe, é um grande self-service onde os animais se comem numa deglutição coletiva planetária, com a morte - a maior equalizadora da vida - servindo como o destino comum de cada um, mesmo que você não tenha sido comido por um outro animal ou morrido de indigestão ao comer um outro animal. Complicado fazer parte de uma cadeia alimentar, mas substituir esse fato por uma visão romântica da natureza não vai tornar as coisas mais fáceis, é justamente essa capacidade de ter consciência que nos diferencia. Um leão faminto não fica com dilemas éticos ao avistar uma gazela, é ela ou ele. Essa batalha de vida ou morte não se dá apenas entre espécies diferentes, quando um leão conquista o harém de um outro leão, ele trata de matar todos os filhotes atuais pra que as leoas fiquem logo no cio pra que ele perpetue a sua linhagem genética. A evolução não é brincadeira, então o ser humano vem tentando encontrar, ao longo do tempo, uma maneira de conviver que não envolva o assassinato puro e simples do outro quando ele é inconveniente. "Não matarás" é um mandamento excelente, mas não é o suficiente. A regra de ouro do "não faça com os outros o que não gostaria que fizessem com você" também cai bem, mas não serve pros masoquistas, ou não existem pessoas que tiram prazer da dor? Então pra que o ser humano tire partido da sua razão e não viva numa permanente guerra de todos contra todos, ele(a) precisa se relacionar com o outro de maneira voluntária, sem violência, sem coerção, essa é a ética ideal pra civilização. Agora, pra que o homem possa se dar ao luxo de ter um código de conduta, é preciso que ele também se alimente, ele não deixou de ter necessidades fisiológicas ou ficou de fora do processo evolucionário por ter desenvolvido um sistema moral. Então, com o relativo aumento da prosperidade, as pessoas começaram a discutir o modo como elas se relacionam também com os animais que lhes servem de alimento, riqueza e companhia - uma discussão que provavelmente nem existia no tempo das cavernas. Ótimo, evoluímos bastante desde então e temos muito o que evoluir ainda, mas soa meio injusto dizer que o ser humano - na média - não é (eticamente?) superior aos outros animais. Me parece claro que é (me acusar de "especismo" não resolve a questão), e se restar alguma dúvida, faça o seguinte experimento mental: deixe um bebê humano no meio do Serengeti, deixe um filhote de leão no meio do Largo da Carioca e imagine como eles estarão depois de um tempo.
Thursday, December 15, 2011
50 mil homicídios por ano no Brasil
O Olavo de Carvalho ["buuuuuhhhh! direitista! buuuuuuhhhh!"] vem falando disso há anos, como é que as coisas podem estar melhorando com esse nível de violência? Matou-se mais no Brasil nos últimos 30 anos que em 53 anos do conflito Israel-Palestina, média de 137 homicídios por dia, 4 por hora. Assumindo que todos gostariam que menos pessoas fossem assassinadas [ou alguém quer mais sangue correndo?], resta descobrir como reverter esse quadro. O governo, a Globo e as ONGs governamentais apontam o culpado de sempre: as armas, que aparentemente são dotadas de vontade própria e saem disparando por aí como se não houvesse amanhã ["não seja simplista, seu reacionário!"]. Outro dia, o Fantástico deu a receita: além de não ter armas, o cidadão não deve reagir, em hipótese alguma, caso um ladrão siga o exemplo do governo e venha "distribuir" a sua renda com uma arma [cuidado, o governo odeia concorrência]. Pra deixar os "revolucionários" agora no poder ainda mais desmoralizados, o mapa da violência indica que o número de homicídios pra cada 100 mil habitantes atualmente é de 26,2, enquanto que em 1980 - no auge da ditadura militar - o número foi de 11,7. ["e o que você propõe, sabichão?"]. Legalização das drogas [aqui os conservadores como o Olavo me acusam de fazer o jogo da esquerda, mas boa parte desses assassinatos é reflexo da proibição - ou não é?]. Endurecimento das penas pros crimes com vítimas [na hipótese da polícia solucionar o crime, não dá prum camarada que matou alguém ficar uns poucos anos preso, impunidade gera mais criminalidade]. Liberalização do porte de arma [o governo quer aprofundar o seu monopólio da força, mas uma sociedade civil armada, ao contrário do que muitos imaginam, é uma sociedade mais segura - pessoas com má intenção não se dão ao trabalho de pagar taxas ou fazer psicotécnicos pra adquirir uma arma]. O problema não é a arma, o problema é o sistema de incentivos que vitimiza o culpado e culpabiliza a vítima, é a sensação generalizada de que o crime compensa, desde a máfia oficial em Brasília até os cafundós das Alagoas.
Wednesday, December 14, 2011
"Os brasileiros gostam de pagar mais caro"
Rolam diversos estudos e pesquisas apontando que o Brasil é um dos países mais caros do mundo, que o Rio é a segunda metrópole mais cara das Américas, que os carros aqui custam o dobro que no México, que os imóveis triplicaram de preço nos últimos 3 anos e por aí vai. As pessoas começam a reclamar com razão e se inicia então a busca pelos responsáveis por essa situação. Por que os carros, por exemplo, estão tão caros? Bom, siga o governo e as regras que regulam o setor e você encontrará a resposta. O que diminui os preços e aumenta a qualidade? A competição interna e externa, coisa que o governo inviabilizou com o aumento de tarifa nos carros importados. Sem competição externa - "pra proteger a indústria nacional" - as montadoras sobem os preços. Como as pessoas ainda assim continuam comprando carros, alguns chegam à conclusão de que "os brasileiros gostam de pagar mais caro" e isso seria verdade se o brasileiro fosse especialmente estúpido ou masoquista, porque ninguém "gosta" de pagar mais caro se puder escolher o mesmo produto por um menor preço. Quem tenta livrar a cara do governo nesse esquema se esquece de que é esse mesmo povo quem elege os governantes, mas beleza. Acontece que, ao mesmo tempo em que o custo Brasil e o protecionismo estatal fazem subir os preços, o governo dá um jeito de baratear o crédito alavancando os seus bancos pra "estimular" o consumo. Então o camarada que quer um carro vê de um lado o preço alto e de outro as condições de financiamento a perder de vista criadas pelo crédito governamental. Ele chia, reclama, mas faz os seus cálculos e vê que, se essas condições permanecerem inalteradas, a compra ainda vale a pena. As montadoras e os sindicatos ficam satisfeitos porque não têm mais a competição externa e têm a sua reserva de mercado garantida. O governo fica satisfeito porque agradou a sua base política e garantiu as doações pra próxima campanha, uma mão lava a outra. Os problemas desse esquema? 1 - os produtos oferecidos aos consumidores se tornam mais caros e de menor qualidade. 2 - o tal "crédito fácil" oferecido pelo governo é feito às custas dos outros, seja na forma de tributação, inflação ou emissão de dívida. 3 - por não ser lastreado em poupança genuína, esse estímulo artificial (boom) vai eventualmente estourar (bust), deixando pra trás um rastro de inadimplência entre os brasileiros que "gostam" de pagar mais caro.
Tuesday, December 13, 2011
Platão < Aristóteles
"Segundo a alegoria da caverna de Platão, o processo para a obtenção da consciência abrange dois domínios: o das coisas sensíveis e o das idéias. Para o filósofo, a realidade está no mundo das idéias - um mundo real e verdadeiro - e a maioria da humanidade vive na condição da ignorância, no mundo das coisas sensíveis - este mundo -, no grau da apreensão de imagens, as quais são mutáveis, não são perfeitas como as coisas no mundo das idéias e, por isso, não são objetos suficientemente bons para gerar conhecimento perfeito." Não quero sair desqualificando o homem (imagine como era o conhecimento há mais de 2 mil anos), mas esse misticismo na linha "o mundo apreendido pelos sentidos não é 'perfeito', então vamos criar um na nossa imaginação" soa como uma fuga da realidade e esse não devia ser o papel da filosofia. "Quanto ao mundo material, o homem poderia ter somente a doxa (opinião) e téchne (técnica), que permitia a sua sobrevivência, ao passo que, no mundo das ideias, o homem pode ter a épisthéme, o conhecimento verdadeiro, o conhecimento filosófico." Se o conhecimento verdadeiro não servir justamente pra sobrevivência neste mundo material, vai servir pra quê? Pra sobrevivência no mundo que não existe? Agora veja que coisa louca: "Dionísio vendeu Platão no mercado de escravos por vinte minas; alguns filósofos, porém, juntaram o dinheiro, compraram Platão e o mandaram de volta para a Grécia, aconselhando-o que os sábios devem se associar o menos possível aos tiranos." Um bom conselho, evitar se associar com quem pode te escravizar, uma mensagem atemporal. O problema é quando não há escolha e o escravizador consegue convencer o escravizado de que não há controle na relação, apenas um contrato invisível assinado por você antes mesmo de nascer. "Os males não cessarão para os humanos antes que a raça dos puros e autênticos filósofos chegue ao poder, ou antes, que os chefes das cidades, por uma divina graça, ponham-se a filosofar verdadeiramente." 3 coisas: racismo ("raça dos puros"), misticismo ("divina graça") e autoritarismo ("chegue ao poder"), a não ser que esses governantes ponham-se a filosofar verdadeiramente e cheguem à conclusão de que é errado controlar os outros. "Platão acreditava que existiam três espécies de virtudes baseadas na alma, que corresponderiam aos estamentos da pólis: A primeira virtude era a da sabedoria, deveria ser a cabeça do Estado, ou seja, o governante, pois possui caráter de ouro e utiliza a razão." Sei, se "razão" significar a conquista, manutenção e expansão do poder sobre os outros. "A segunda espécie de virtude é a coragem, deveria ser o peito do Estado, isto é, os soldados ou guardiões da pólis, pois sua alma de prata é imbuída de vontade." Ou seja, o braço armado da "vontade" que garante a conquista, manutenção e expansão do poder sobre os outros. "E, por fim, a terceira virtude, a temperança, que deveria ser o baixo-ventre do Estado, ou os trabalhadores, pois sua alma de bronze orienta-se pelo desejo das coisas sensíveis." A plebe ignara - "de bronze" - que não tem razão nem coragem, mas que trabalha pra bancar a pureza dos governantes iluminados. "Platão acreditava que a alma depois da morte reencarnava em outro corpo, mas a alma que se ocupava com a filosofia e com o Bem, esta era privilegiada com a morte do corpo. A ela era concedida o privilégio de passar o resto dos seus tempos em companhia dos deuses." Reencarnação, deuses, alma, governantes com "caráter de ouro" iluminados pela razão e esse desdém pela realidade apreensível pelos sentidos: tá difícil, hein, Platão?
Monday, December 12, 2011
A liberdade sexual
Não acredito em Deus, não acho que seja possível derivar uma moral a partir de escrituras "sagradas" e sei que a disputa pela hegemonia da fé entre as religiões (ou mesmo entre facções da mesma religião) alimenta guerras desde sempre, mas não é por isso que vou descartar de antemão tudo o que os crentes falam. Lembre-se, matar é errado segundo os 10 Mandamentos e essa é uma regra boa se você considerar a preservação da própria vida uma coisa boa. Veja, por exemplo, a "revolução sexual" dos anos 60. Depois de séculos de castração religiosa, as mulheres que viviam na defensiva em relação ao sexo - "só depois do casamento" - de repente se sentiram livres pra explorar as suas fantasias, com a disseminação da pílula anticoncepcional colocando ainda mais lenha na fogueira. Beleza, qual foi o resultado disso? Se a gente considerar que a liberdade sexual deve ser acompanhada da responsabilidade sexual, alguns problemas:
Thursday, December 08, 2011
Caco, Aristóteles e Miss Piggy
Toda hora ouço falar que Aristóteles isso e Aristóteles aquilo (depende do ambiente). Mó vergonha não ter lido um livro inteiro do cara que inventou a lógica (a lógica não se "inventa", se descobre). E tenho as melhores referências dele, tipo a influência que ele exerceu sobre diversos pensadores que defendem as liberdades individuais e a lei da identidade (A = A). Porque ter objetividade e admitir que A é A parece às vezes uma peça de resistência em certos ambientes intelectuais, onde A pode ser A e o seu contrário ao mesmo tempo (Z?) dependendo da conveniência do momento (sacadas estilo "menos é mais" e "imposto é voluntário"). Nem quero tirar o prazer das pessoas em serem poéticas subvertendo o sentido das palavras, mas não é possível ter uma discussão racional a respeito de coisas importantes com essa postura (ih, fechou o tempo). O Aristóteles da wikipédia esclarece: "Caco é verde" é uma consequência lógica de "todos os sapos são verdes" e "Caco é um sapo", porque seria auto-contraditório afirmar estas últimas sentenças e negar a primeira. A consequência lógica é a relação entre as premissas e a conclusão de um argumento válido" (ou seja, lógico). "Na filosofia aristotélica, a política é um desdobramento natural da ética." Se a gente entende a ética como o modo como as pessoas lidam umas com as outras, beleza, o Caco está sendo político no melhor sentido da palavra ao flertar de maneira persuasiva com a porquinha dos Muppets (pura sedução). "Aristóteles foi o verdadeiro fundador da zoologia e a ele se deve a primeira divisão do reino animal." Caco é livre de preconceitos e acredita na diversidade animal, como explicar a atração de um sapo por uma porca? (Aristóteles deve ter algum insight a respeito) "Ele acreditava que a mulher era um ser incompleto, um meio homem. Seria passiva, ao passo que o homem seria ativo." Como Miss Piggy não é uma mulher e sim uma porca, não se ofendeu, pelo contrário, sentiu admiração pelo polêmico machismo peripatético (porcas são imprevisíveis). Como o Caco tá topando qualquer parada, embarcou na onda e deu-se início então ao estagirismo à trois (foto meramente ilustrativa).
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