Monday, August 22, 2011

Os ricos

Warren Buffett, o bilionário favorito do New York Times, fez um apelo pra que os ricos pagassem mais impostos e "dessem a sua parcela de sacrifício aos EUA." Se ele considera dar dinheiro ao governo uma coisa boa, podia começar dando o exemplo, mas não, quer que os outros sejam obrigados a isso. Impostos não são voluntários, se fossem, teriam outro nome. Quando os políticos e os seus amigos começam a falar em sacrifícios (dos outros), é porque o esquema tá em perigo e se inicia a busca por bodes expiatórios. Claro, há ricos e ricos. Uns enriquecem através do meio econômico, vendendo o que as pessoas querem comprar. Se eu gasto 50 reais num produto do Radiohead, é porque eu valorizo mais esse produto que os 50 reais e vice versa, ambas as partes saem ganhando. Outros enriquecem através do meio político, que tira à força de uns pra dar pra outros. Se o BNDES tira X dos pagadores de impostos pra subsidiar os projetos do Eike Batista, o Eike ganhou e quem pagou, sem querer pagar, perdeu. O meio econômico é voluntário e aumenta a riqueza, o meio político é coercitivo e divide a riqueza. Ninguém me obriga a comprar o vinil do Radiohead, o governo me obriga a subsidiar os negócios do Eike Batista. Feita essa distinção, não é difícil entender o motivo da popularidade desse tipo de apelo contra os ricos. Ao dizer que os ricos são ricos porque "exploram" os pobres, a ideologia marxista dá um verniz teórico a um dos sentimentos menos nobres do ser humano, a inveja. Agora, como é que o Radiohead - uma banda rica, sem dúvida - me "explorou"? Pelo contrário, os seus fãs se reúnem tentando fazer com que a banda os "explore" ainda mais e sentem que não foram "explorados" o suficiente, @queremos mais "exploração", seus ingleses desgraçados apropriadores de mais-valia. Além disso, a riqueza é relativa. Um torneiro mecânico no Brasil é rico em relação a um torneiro mecânico no Zimbábue. Uma pessoa considerada pobre hoje nos EUA vive mais, melhor e desfruta de um conforto material que um industrial inglês do século 19 nem poderia sonhar. A riqueza não é um bolo fixo que deve ser repartido pelo governo (que acaba ficando com o maior pedaço), a riqueza é criada e cresce através da acumulação de capital - que os marxistas odeiam - e o seu investimento no aumento da produtividade, fazendo-se mais coisas com menos custos. Se um país começa a penalizar os seus ricos por serem ricos, esses ricos vão pegar a sua poupança e investi-la em outra vizinhança, secando então a fonte que financia a demagogia dos políticos e o proselitismo dos intelectuais anticapitalistas.

Thursday, August 18, 2011

O trabalho "escravo"

"Empregada por uma brasileira, que a concedeu dias de licença maternidade, Julia trabalha 10 horas por dia, e mesmo assim diz que sua vida aqui é melhor do que na Bolívia." Um sinal da decadência intelectual de um país é o modo como os conceitos são deturpados nos debates públicos pra servirem - não à busca honesta da verdade - mas aos objetivos políticos dos seus proponentes. Quem é um escravo? Um escravo é quem não tem o controle sobre o próprio corpo e pertence a uma outra pessoa, é alguém que não tem a propriedade de si mesmo. Um escravo, por definição, não pode pedir demissão, pegar o seu boné (ou o seu poncho) e ir à luta em outra freguesia. Só que a confusão chegou num ponto em que equivaler um assalariado a um escravo e um empregador a um senhor de escravos virou a norma nas discussões e quem questiona isso só pode ser um FDP da TFP. Não que o meu objetivo seja antagonizar, isso não é a causa do que escrevo, é a consequência, se acontecer. Se eu quero tentar me aproximar  o máximo possível da verdade, o mínimo que eu posso fazer é respeitar o significado das palavras e não me engajar em manipulações emocionais pra parecer bonzinho segundo a mentalidade mais influente do momento e assim ganhar pontos na gincana social. Claro que eu prefiro que as pessoas gostem de mim, mas se o que escrevo vai contra o que elas acreditam, paciência. Se alguém concorda em trabalhar nas condições X, é porque as alternativas não eram melhores segundo a sua própria avaliação, não há escravidão. Não obedecer todas as regras impostas pela CLT também não faz do empregador um senhor de escravos, não importa quantas vezes os jornais, as TVs e os demais puxa-sacos do governo repitam isso. Se vê por aí muita indignação contra a ganância dos empresários, seus lucros exorbitantes e as corporações exploradoras - "o governo tem que contratar mais fiscais e endurecer as leis contra esses malditos sem coração." Mas por que será que quase metade da mão-de-obra no Brasil - fora os desempregados - vive na informalidade? Seria por uma falha de caráter do brasileiro, uma tendência irresistível em não seguir as leis simplesmente pelo prazer de burlá-las? Ou isso teria mais a ver com a falta de contato dessas leis com a realidade? Se as pessoas não conseguem cumprir as normas da CLT - uma legislação inspirada na Carta del Lavoro de Mussolini - de quem é a culpa, das pessoas ou da lei? Esses empregos dos bolivianos da Zara nem existiriam caso eles estivessem formalizados, eles não teriam como competir com os preços de lugares sem os custos da CLT, teriam então que fazer outra coisa da vida, tocar flauta na praça (existe algum sindicato dos flautistas filiado à CUT?) ou voltar pro socialismo-indígena-do-século-21 de onde fugiram. (http://operamundi.uol.com.br/noticias_ver.php?idConteudo=4004).

Monday, August 15, 2011

O welfare state

Garantir uma renda mínima para todos me parecia uma boa idéia quando eu tinha os meus 20 anos. Claro, há riqueza o suficiente no mundo e basta o governo tirar dos mais ricos e dar pros mais pobres pra justiça social se realizar na Terra. Nada de comunismo, socialismo, nenhum radicalismo do tipo, apenas a boa e velha social-democracia, o caminho do meio entre a liberdade de mercado e o planejamento de estado comandado por políticos benevolentes e compassivos - "só temos que votar nas pessoas certas, gente." Então a internet apareceu e o meu horizonte - que antes se resumia, fora do ambiente familiar, ao sistema educacional e aos poucos jornais e canais de TV - se expandiu tremendamente. Eu não podia mais adocicar a história do socialismo, não tinha mais o direito de ignorar os conceitos que os ministros da Fazenda do Brasil disfarçavam com o economês trololó, não podia mais engolir o enredo da Revolução Industrial malvada que tirou os ingleses das suas existências idílicas no campo pra enfiá-los (aparentemente à força) em fábricas alienadoras e exploradoras. Não, um mundo novo de informação se abria pra mim e eu não podia permanecer confortável na minha ignorância orgulhosa, eu tinha que escarafunchar a Grande Rede pra formar uma opinião mais consistente com a realidade. Havia, entre a verdade e o que me era apresentado como a verdade, um vão gigantesco que eu devia preencher cruzando dados e fatos, era apenas uma questão de querer realmente entender, os meios estavam todos à minha disposição. Então, depois de anos estudando e jogando fora todo o papo furado, cheguei à seguinte conclusão: a diferença entre o welfare state e a sua falência é uma questão de tempo. Essa constatação não é meramente pragmática, porque também me parece claro que é fundamentalmente errado tirar de A pra dar pra B, com o governo e os seus agentes retendo uma boa parte dessa pilhagem. E mesmo supondo que conceitos como o contrato social ou o consentimento dos governados sejam válidos (não são), ainda assim o welfare state continua não sendo - pra usar uma palavra da moda - sustentável no longo prazo. Dessa sustentabilidade ninguém fala... Se a pessoa vai receber uma renda - tirada à força dos outros - simplesmente pelo fato de existir, surgem alguns problemas. Primeiro, a deterioração da estrutura familiar. Na Inglaterra, por exemplo, as mães solteiras são subsidiadas pelo governo e o que é subsidiado tende a aumentar, é uma questão lógica de incentivos. Com mais mães solteiras, mais jovens soltos por aí sem uma base familiar sólida, se agarrando então a outros jovens sem perspectiva, numa espécie de tribalismo urbano. Isso também cria um ressentimento mútuo entre as pessoas que pagam e as que recebem os subsídios, potencializando sentimentos como o nacionalismo e a xenofobia. Se essa ajuda governamental não existisse, as pessoas teriam que ser mais responsáveis pelas suas escolhas (inclusive sexuais) e teriam que confiar mais nas suas famílias e amigos como suportes em momentos de dificuldade, teriam que agir de forma que, caso precisassem, as pessoas mais próximas estariam dispostas a - voluntariamente - ajudá-las. Se ela vai receber um cheque do governo no final do mês independentemente do que faça, a tendência é a desintegração gradual desses laços. Óbvio que isso que estou dizendo soa como um conservadorismo atroz pra quem entende a onda de destruição na Inglaterra como uma falha do sistema em atender às justas demandas dos jovens-de-adidas-e-celulares-oprimidos-pelo-capitalismo, porque essas pessoas enxergam o governo como the ultimate provider e vêem o núcleo familiar como um obstáculo ao controle central que tanto apreciam. Repare que essas manifestações violentas, greves gerais e quebra-quebras na Europa acontecem justamente nos momentos em que a realidade bate à porta e os governos são obrigados a cortar alguns gastos e privilégios que esses grupos de pressão encaram como direitos adquiridos. Só que direitos adquiridos exercidos às custas dos demais não são direitos, são privilégios. O padrão é o seguinte na disputa democrática: os candidatos prometem uma aurora de maravilhas, os eleitores convenientemente acreditam no almoço grátis (imaginando que estarão mortos no longo prazo) e votam no político mais generoso com o dinheiro alheio. Acontece que, com o tempo e os incentivos do sistema, cada vez menos pessoas pagam e mais pessoas recebem os benefícios, colocando as contas públicas numa encruzilhada. Os governos então tentam adiar a bancarrota se endividando e/ou imprimindo dinheiro (criando inflação), mas isso não resolve o problema. Com as contas deterioradas, o desemprego e a insatisfação aumentam, abrindo espaço pra oposição assumir o poder prometendo um pouco mais de austeridade. Algumas mudanças são ensaiadas, contando sempre com a oposição no limite da sabotagem dos movimentos sociais (o PT e os seus tentáculos no Brasil são bons exemplos desse comportamento). Analistas políticos e outros intelectuais de esquerda aparecem na televisão e nos jornais reclamando dos cortes nos gastos sociais, que isso é uma desumanidade do capitalismo selvagem contra a justiça social etc e tal, que o país precisa de uma nova esperança, de um novo tempo contra a desigualdade social, vocês conhecem a ladainha da chantagem emocional. Então, depois de algumas pequenas reformas que evitam momentaneamente o colapso econômico, os campeões do outro mundo possível estão preparados pra retomar o poder e iniciar uma nova rodada de demagogia, até o dia em que o dinheiro dos outros acaba de vez e os outros ainda levam a culpa.